Os indigestos infringentes

O julgamento dos embargos infringentes no processo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal tem dado muito o que falar. Sobretudo para quem não é do ramo jurídico, causa estranheza e até ira. Algo grave, porém que não tem sido comentado, é o fato de a Suprema Corte ter que parar para decidir se um tipo recursal existe ou não, por pura desorganização legislativa e confusão regimental. É aquela história: está feito o imbróglio, mas vamos fulminá-lo quando ele “despertar”.

Quanto ao acolhimento dos embargos dos mensaleiros, evidente que todos adorariam ver tal corja na cadeia, em regime fechado, embora o julgamento dos embargos não necessariamente signifique que ficarão impunes, como equivocadamente se tem espalhado. Fato é que plena razão possui o Ministro Celso de Mello, que ontem pronunciou seu voto de desempate a favor do acolhimento dos embargos infringentes. Todo mundo tem direito ao duplo grau de jurisdição, isto é, ter seu julgamento revisto por uma instância superior, justamente para evitar sentenças e decisões arbitrárias e totalitárias pelo Judiciário, como nos períodos de exceção. Como o mensalão, pela prerrogativa de foro (o tal “foro privilegiado”, que de privilegiado não tem nada), já nasce na última instância, não há revisão em instância superior.

Penso, sobretudo, haver uma grande falha o processo nascer diretamente no Pleno do STF, não em uma de suas Turmas. Quem rejulgará serão exatamente os mesmos onze ministros, ao passo que, se tivesse nascido em uma de suas Turmas, cinco ministros julgariam o mensalão e todos os onze, os recursos. Eis o duplo grau, ainda que paralelo, no mesmo órgão.

Outro ponto muito falado é com relação ao clamor popular. Ora, não pode um juiz se ater à opinião pública, pois comprometer-se-ia duas características primordiais da magistratura: a imparcialidade e o livre convencimento. Decisões judiciais não podem ser plebiscitárias. Como bem disse o decano da Corte, o Tribunal “não pode se expor a pressões externas, como aquelas resultantes do clamor popular e da pressão das multidões, sob pena de abalar direitos e garantias individuais e levar à aniquilação de inestimáveis prerrogativas que a norma jurídica permite a qualquer réu diante da instauração em juízo do devido processo penal”. A verdade é que a opinião pública, como no caso bíblico Jesus x Barrabás, não distingue o absolvido e o condenado. São todos previamente culpados e sem direito à defesa, à luz da mídia. A sociedade que condena é a mesma que elege e reelege. Vale contra o bandido. Mas… e se fosse o mocinho, condenado injustamente?

Que sigam com esse cansável julgamento e, espera-se, mantenham as penas. E, por favor, sejam céleres.

Uma resposta to “Os indigestos infringentes”

  1. Larissa Peixoto Says:

    Excelente! Muito coerente a ideia de um primeiro julgamento nas Turmas para haver algo mais parecido com um duplo grau de jurisdição!

Deixe um comentário